10.3.10

A Minha Odisseia - Trilhos de Almourol



Continuação do tema anterior 36 Anos Depois



Ó mar eterno, mar eterno,
Que no tempo perduras,
Canta-te em “Odisseia” Homero,
Heróis de fantásticas aventuras.


Poesia: "Mar Eterno" - Mário Lima - Nov.75


Entrados na estrada, em sentido contrário havia uma prova de BTT, já enlameados, há um novo regresso aos trilhos, à lama e desta vez havia um pequeno ribeiro onde se aproveitou para se lavar os ténis. Mas não valia a pena, logo a seguir nova subida e mais lama.


Seguindo pelo estradão de novo, a seguir a uma curva vejo uma obra de Engenharia. A Escola Prática de Engenharia tinha colocado uma ponte sobre botes de forma a se poder atravessar o rio Nabão sem problemas.


Depois é um sobe e desce por terra e mato com lama, muita lama, com passagem por baixo da ponte ferroviária, em cima de cascalho, até Constância. Já nessa altura o António Almeida (obrigado amigo pela tua companhia) se tinha ido embora. Camões, do outro lado do rio, deveria estar a escrever uma Ode a estes valentes que por tais trilhos se aventuraram. Depois de abastecido, novas subidas em terras pretas, amarelas, charcos e cada vez mais cansado. Uma pequena ponte de madeira faria inveja aos romanos.


Passo pelo apeadeiro do comboio de Almourol mas já na companhia do Paulo Paredes. Passagem pela Escola Prática de Engenharia e após uma subida penosa penso que foi aí que nos enganamos no percurso. Não vimos as fitas rentes ao solo, continuamos sempre em frente e de repente ouvimos uma voz vinda do arvoredo em baixo: «Vocês estão enganados, a descida é lá atrás. Voltamos e entramos no trilho certo. Pouco depois fomos alertados por alguém da organização com uma BTT, para o magnífico espectáculo que iríamos ver, o Castelo de Almourol. Confesso que permaneci ali algum tempo a olhar para aquele Castelo magnífico no meio das águas do Tejo. Soberbo!


Pouco depois a Susana passou por nós. Ia ligeira e fiquei satisfeito de a ver. Felizmente tudo tinha corrido bem lá na barragem. Pensei em acompanhá-la mas o Pedro estava em dificuldades e como estávamos sós esperei que mais alguém se chegasse a nós e abalei. Descia, voltava a subir, poças, lama e nunca mais o acabar. Estava desesperado pois para além das pedras nos ténis, uma dor aguda alojou-se no ombro impedindo-me a locomoção normal pois só fazia movimentos com um braço. Depois de mais um abastecimento, mais uma maravilha, passar por um túnel que dava acesso ao outro lado da linha do comboio. Aí o segundo engano. Uma das moças disse para seguir, virar à esquerda e depois direita. Fui sempre em frente à espera de voltar à esquerda. Pensei que teria que voltar a passar a linha do comboio de novo, mas havia algo que estava mal. Pareceu-me ter visto algo a agitar ao vento no solo alguns bons metros atrás. Olho para trás e ao longe estava o pessoal frenético a agitar os braços como a dizer que estava enganado. Lá voltei e entrei mais uma vez no trilho. No cimo um canzarrão mostrou-me os dentes mal encarado. Mas já estava por tudo.

Confesso que estava há espera de encontrar a rampa “Delta da Lebre” os "Rolling Stones" conforme a defini, a tal dos seixos rolantes, sinal que estaria perto da meta. Vejo a Rosa e coloco-me ao lado dela. Sempre seria melhor em companhia. Mas a Rosa tem outra pedalada, enquanto eu subia com as mãos nas pernas ela subia com dificuldade mas na maior. Passávamos os dois num lamaçal, enfio os pés naquilo, que se lixe, já nada me importava. Atrás ouço a Rosa aflita, os ténis e pernas estavam atolados, ela disse-me, depois de lá sair, que aquilo pareciam areias movediças. Lá continuamos. Ela adiantou-se, olho para trás e quem vejo?! O Pára que não para, não o fazia ali. Tentei adiantar-me mas as dores no ombro eram muitas e as das pernas não eram menores. Ao fazermos o acesso ao 33,5km onde estava o abastecimento, avisaram-nos que tínhamos que virar à direita, mas do lado esquerdo também haviam fitas e a Rosa com os “phones” nos ouvidos, não ouvindo a indicação, voltou à esquerda. Bem gritei por ela e ela nada, sempre em frente, afastando-se cada vez mais. Não tive outro remédio senão ir buscá-la. Não sei onde fui buscar energia para "sprintar" e trazê-la de volta ao caminho certo. O Joaquim ficou à nossa espera no abastecimento. Pergunto à Otília se os seixos que tínhamos passado anteriormente eram os tais, e ela disse-me que não, eram outros mais à frente. Na foto tenho um sorriso mas já não sabia se devia sorrir se chorar!


Depois foi um tormento até ao fim. A Rosa e o Joaquim foram-se, subi os seixos, desci, subi o trilho dos gatos, lama barrenta e nela vejo... uma perna de galinha! Deve ter havido uma noite de folia para os gatos das redondezas. Depois foi um caminhar junto à A1. Os carros em alta velocidade e eu em passo de caracol. Lavei os ténis na albufeira do Jardim do Bonito, mas logo a seguir mais um trilho, voltei a ficar cheio de lama, sempre incentivado pela Célia Azenha que tinha passado por mim, foi percorrendo os metros (kms?) que me faltavam, mas já não corria, andava com o braço junto ao corpo. As dores eram enormes, de repente ouço uma voz a chamar por mim, era a Isabel, esposa do António Almeida. Não era agora que iriam ver o meu sofrimento, arranquei e com o sorriso possível nos lábios, 5h43'24'' depois de iniciar a prova, cortei a Meta.



Para a organização da CLAC, nas pessoas do Brito e Otília, os meus Parabéns pela prova. A prova é dura, teve kms a mais, quase que jurei em não me meter noutra, mas penso no próximo ano lá voltar!

Irei colocar um último tema dedicado a esta prova. Mas será toda ela de fotos. Há muitas e ficarão aqui como registo de alguém, eu, que com sete dias de diferença, percorreu 70km por montes e vales, por lama e charcos, por pedras escorregadias, por rios, por vistas maravilhosas, mas essencialmente com os amigos; a família Almeida, a família Veloso, o Carlos Coelho, o Pedro Marinho, outros amigos e a equipa do Pára&Comando.

8 comentários:

Susana disse...

Olá Mário, uma Odisseia sem dúvida!
Como já disse, uma experiência maravilhosa também! Muita dificuldade sim, as mazelas deram o seu sinal durante esta semana, mas o prazer ali sentido compencou tudo isso.
Adorei a companhia dos "Pára e Comando" para esta Odisseia!
Muitos Parabéns pela sua prestação!
Até sempre

BritoRunner disse...

Grande aventura Mário

Foi um prazer ter estado na sua companhia.

JCBrito

Vitor disse...

Olá Mário,
Fui um prazer fazer parte da sua Odisseia, gosto muito de estar na sua companhia nem que só seja de semana a semana.
Foi um prova estupenda e vai permanecer nas nossas mentes durante muito tempo.
O meu post ainda não saiu por falta tempo, muito trabalho e Ruth tem ido todos dias ao hospital, “como sabe”, ver o pai dela e tenho que ficar com a Carolina, mas já falta pouco, hoje publico.
Grande abraço
Vitor Veloso

luis mota disse...

Grande Mário!
Imagino as dificuldades que passou mas com valentia chegou ao final.
Não é fácil fazer 38 km, depois de tanta chuva e sabendo que na semana anterior foram 30 Km no Sicó, assim esta foi uma jornada triunfal.
Agora recuperar e depois encarar novo desafio.
Aproveito para saudar toda a equipa Pára & Comando pelo desafio superado.
Grande abraço,
Luís mota

amantes da corrida disse...

Olá Mário,

Está tudo dito, um regresso em apoteose ao asfalto e agora também aos trilhos, alguns desabafos, eventual sofrimento, mas no final...temos Homem, já está a pensar em voltar a repetir a dose no próximo ano...parabéns e aquele abraço!

joaquim adelino disse...

Olá Mário, estava custoso de sair! tal como a prova, não? Foste um valente e não fora aquela mazela no ombro e terias de certeza mais força para a parte final da prova.
Mas o corpo é que manda e não devemos abusar contra ele. Tiveste 2 anos parado e estás a voltar aos poucos e a cautela é a melhor conselheira, ainda bem que não remaste contra a maré e deixaste que as coisas fossem acontecendo.
Ainda temos muitos desafios pela frente este ano, por isso vamos com calma e estes dois trails vêm sem dúvida dar um contributo em experiência acumulada que nos vai ajudar a gerir melhor e com mais confiança outras metas que estão no nosso horizonte.
Fiz hoje a inscrição para a Maratona do Carlos Lopes pela equipa do Pára&Comando, pois como sabes a nossa equipa do CCDLoures vai estar em Moscavide neste dia.
Gostei muito de ler a tua Odisseia e admira-me que te tenhas perdido tanta vez, aquilo estava muito bem marcado, eu vi todas as sinalizações e só alguma distração ou o "carreirismo é que pode ter provocado os erros. Nos Comandos não aprendeste bem a lição, eles ensinaram como te devias orientar mas os anos já pesam e a memória já não ajuda, eu provavelmente serei mais atento, nos Páras ensinaram-me a ser pisteiro e seguir as pegadas e olha que elas estavam bem visíveis devido à intensa lama que existia durante todo o caminho, safei-me sem erros e sem quedas, aquilo que a gente aprende! tanto caí a aprender a cair de Pára-quedas que ainda estou a tirar partido desse tempo, mas agora a não cair.
Dá-me a impressão que fui o único que passei pelo Castelo de Almourol e não o vi, e eu que gostava tanto de voltar a vê-lo, tantas descidas de rapel e de cordas fiz eu naquele local, mas como eu só estava concentrado no que ia a fazer passou-me despercebido, quando me lembrei já ia a chegar a Tancos, ainda olhei mas já era tarde de mais. Compensei depois ao observar logo ali à frenre o Arrepiado e aquela várzea junto ao Rio Tejo onde saltei e ganhei a minha Boina Verde.
O resto já tu disseste, cheguei-me a ti e mais metro menos metro caminhámos juntos, cada um com o seu sofrimento e tal como tu quando cheguei áquele ribeiro no Parque do Bonito e me disseram que tinha de passar lá por dentro foi a melhor coisa que me podiam dizer naquele momento, os pés já escaldavam e aquela água fria deu-me vida novamente e foi um alento para fazer aqueles metros finais.
Já vou longo e estou a falar de mim, mas sei que estes episódios também foram os teus.
Abraço.

João António Melo disse...

Boa tarde amigo Mário, da forma como descreves cada detalhe, denota o grande empenho e gosto que dedicaste a esta prova. Quando falaste na passagem pelo Rio Nabão veio-me logo à lembrança também uma peripécia da minha vida, quando cumpria o serviço militar no R.I. Tomar, numa fria e chuvosa instrução nocturna, em que ia sendo levado pelas águas, numa travessia do Nabão. Estas provas são bem diferentes das demais, pois além do convívio e da partilha, também tem que haver uma grande camaradagem e entre-ajuda dos participantes, pois surgem sempre alguns problemas pelo caminho. É de realçar a tua sempre boa disposição e deve ser gratificante ter como camarada de lutas uma pessoa assim tão optimista. Um abraço!

.JOSÉ LOPES disse...

Olá Mário
Excelente texto

Correr 40 km em sobe desce deve ter sido um esforço maior do que correr uma maratona.

Uma aventura com subidas, com descidas, com quedas, com dores, com boa disposição,boa companhia conseguir chegar ao fim é uma grande façanha.

Obrigado pela lembrança em relação à minha lesão.
Continua a dor.

Já uso as tais palmilhas correctoras.

Vou no 3º tratamento com ondas de choque, são 4, o fisioterapeuta, diz que, após duas semanas do fim do tratamento desaparece a dor.Será?

As melhoras do ombro
Com os cumps
J.Lopes

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