5.1.21

Covid-19 - A Morte

Enquanto permaneci na UCI estive sempre durante o período da noite, com uma máscara terrível que insuflava oxigénio a 15L/min. tal a infeção que tinha nos pulmões, a máscara VNI. Durante o dia era uma outra máscara mais suave. À noite pedia a todos os santinhos para que rapidamente deixasse de ser dependente daquela máscara que me obrigava a estar de boca aberta, que me secava a garganta e o nariz mas, segundo os médicos, foi esta máscara que me 'salvou'.

Os médicos verificando que eu tinha melhoras aquando a sua utilização, fizeram-me perceber que a evolução da minha cura dependia da máscara. E eu claro acedi, iria sofrer dias com aquela máscara, até que um dia ma retiraram, só necessitava de um débito de 5L/min., aquela acabava ali a sua função.

Por duas vezes, porque me virava muitas vezes, o tubo soltou-se da máscara e eu aflito à procura dela mas lá consegui encontrar e encaixar. Todos os dias, depois do pequeno almoço, sentava-me num cadeirão por indicação médica. Como tive uma grande infeção, o estar sentado seria para expandir os pulmões. Sentava-me de manhã até ao lanche. Os enfermeiros ao verem-me tanto tempo ali sentado, perguntavam se não queria deitar e eu: Não! Se era para expandir os pulmões então vamos expandir.

Na hora que saí do UCI disse-me uma enfermeira: Sr. Mário, vamos ter muitas saudades suas - Porquê - perguntei - É que você não deu trabalho nenhum.

Claro que dei trabalho, mas procurei ser sempre colaborante e é isso que está no relatório.

Andei de quarto em quarto, ora em cama, ora de cadeira de rodas, sempre com uma botija de oxigénio atrás.

Depois de estar em quartos sozinho onde deambulava agarrado à cama, ou dando pequenos passos, sempre com a máscara, para isso colocaram-me um tubo com mais de 2 m para tanto ir tomar banho, como para andar o que podia (durante a permanência perdi 10 kg e muita massa muscular), fui para um quarto onde tinha companhia. Inicialmente um senhor de 81 anos que foi transferido para o Hospital das Forças Armadas dois dias depois. Admirava aquela pessoa, com aquela idade e cheia de força de viver. Durante a noite a única luz que tínhamos acesa era a da casa de banho para podermos lá ir sem ser às escuras.

Depois da saída deste companheiro (as camas eram sempre desinfetadas), perto da uma da manhã, entra um novo utente. Ligado a máquinas, com uma farfalheira terrível, fica ali a meu lado (tínhamos uma cortina a separar). As enfermeiras sempre em cuidados com ele, nessa noite não dormi nada tal era o barulho que o JS fazia (sei o nome mas, como é óbvio, não o coloco aqui).

Durante esse dia a farfalheira continuava. Eu olhava para ele impotente, ele com ar suplicante, as enfermeiras dando o seu melhor. Perto das três horas da tarde, a farfalheira deixou de se ouvir, um som cavo e silêncio absoluto.

JS tinha morrido!

foto: na cama que se vê ao fundo.

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